O evento Capitalismo de Laços no Brasil: o que pode mudar com a Lava Jato? que ocorreu no último 30 de agosto, reuniu empresários e acadêmicos com o objetivo de discutir as relações entre os setores privado e público no país.
Organizado pelo Centro de Estudos em Negócios do Insper, contou com a participação de Salim Mattar, fundador da Localiza; Flavio Gurgel Rocha, presidente das Lojas Riachuelo; Dalton Gardimam, head de pesquisa de renda fixa da Bradesco Corretora, e Sérgio Lazzarini, professor titular da Cátedra Chafi Haddad no Insper.
A conversa foi mediada por Fabio Motta, diretor de fundos da Western Asset Management e aluno do Mestrado Profissional em Economia .
Períodos de mudança
Para entender a situação atual do Brasil, o professor Lazzarini fez uma associação com os Estados Unidos do final do século 19. Na época, existia um cenário de país emergente com muita corrupção. “O que ocorreu nesse período e provocou uma transição positiva foi o estabelecimento de uma crise seguida de uma imensa insatisfação popular. Sem contar que a redução no custo de impressão permitiu a qualquer cidadão se informar”, relatou o professor.
“O Brasil, atualmente, passa por uma situação similar. Existe uma comunicação mais facilitada graças às redes sociais e uma crise potencial que cria a insatisfação do povo. Sem contar que há um sistema judiciário que está se movendo para fazer punições, como vimos na Lava Jato”.
Esse cenário é propício para fazer a sociedade entender o que está ocorrendo no país e reivindicar mudanças. Porém, segundo os empresários presentes, apenas uma modificação geral no sistema pode, de fato, incorrer em um futuro próspero.
“Não podemos desperdiçar essa crise acreditando que é uma questão puramente de falta de ética”, reforça Rocha, da Lojas Riachuelo. Segundo ele, não basta substituir alguns nomes e acreditar que tudo estará resolvido se não for instaurada uma mudança sistêmica.
O evento foi transmitido ao vivo. Veja a gravação:
Cidadão protagonista
Para reformular as políticas econômicas e sociais vigentes, Mattar, por sua vez, acredita que os cidadãos devem ter uma participação mais ativa, se posicionando com protagonismo. “Você perde um tempo por semana para diferentes atividades. Visita a sogra aos domingos e joga futebol com os amigos aos sábados Mas aí eu pergunto: quanto tempo você tem dedicado a seu país?”, indagou.
É certo que a grave situação econômica tem despertado um debate mais substancial sobre os rumos da economia brasileira. Para os debatedores presentes, o Brasil ainda não oferece um ambiente de negócios favorável a empreendedores e empresários.
Fragilidades do capitalismo no Brasil
De acordo com Gardimam, a opinião geral do brasileiro a respeito do termo “capitalismo” é bastante dúbia. “Ainda existe uma visão deturpada de qual é a essência desse sistema econômico”, afirmou.
Para explicar, o head de pesquisa de renda fixa da Bradesco Corretora optou por adotar a definição do economista Ludwig von Mises, segundo a qual capitalismo é a soberania do consumidor. “Esse conceito é democrático, heterogêneo e justo. Porém, ao pensarmos nele diante da realidade aplicada no Brasil, nos deparamos com uma distância absurda”, revelou. Rocha acrescentou ainda que o livre mercado é o conjunto de estímulos e incentivos mais harmônico que existe para fazer um país prosperar.
Os empresários presentes foram taxativos na crítica ao empresariado que busca vantagens competitivas à custa de benesses e intervenções do governo. Essas intervenções escolhem os “campeões nacionais”, favorecem alguns setores e empresas, mas acarretam num alto custo para a sociedade, que deve “pagar” pelas concessões. Um dos exemplos mais citados abordou a relação ao mercado de crédito: “Como pode existir capitalismo no Brasil se 70% do crédito é estatizado?”, questionou Mattar.
Modelo asiático
Ao citar exemplos de países com ótimo desenvolvimento e boa conduta, os palestrantes destacam algumas nações asiáticas. A China foi lembrada por Rocha. Segundo ele, o país teve muitas conquistas no que se refere às condições de trabalho. “De 15 anos para cá, eles evoluíram muito. Hoje, o chinês ganha em dólar o mesmo que o brasileiro recebe, só que seu poder de compra é três vezes maior”, afirmou.
Já a Coreia do Sul foi mencionada por Mattar como exemplo de produtividade. De acordo com o fundador da Localiza, os asiáticos apresentam uma cultura de trabalho mais regrada, além de contarem com uma legislação mais flexível. “Enquanto isso, no Brasil, a carga tributária é de 49%. Ela é excessiva e consegue destruir o capitalismo brasileiro e a capacidade das empresas contribuírem com a geração de riquezas”, afirmou Mattar.
Os modelos desses países apontam para algumas medidas que podem inspirar a sociedade brasileira. O investimento eficiente em educação e uma economia aberta que de fato compete com outros países em escala global e se vê obrigada a conquistar a produtividade de sua indústria.
Capitalismo de Laços
Em 2010, Sérgio Lazzarini lançou o livro Capitalismo de Laços, que aborda a ampliação do poder do Estado sobre as companhias privadas. Leia aqui entrevista do professor sobre o livro.