
A terceira edição de Transações entre Partes Relacionadas – Um Desafio Regulatório Complexo e Multidisciplinar mal chegou ao mercado (o livro saiu em novembro) e o advogado e professor André Antunes Soares de Camargo já está às voltas com a próxima versão, que será, tal como a atual, “revista e ampliada.” Assim como no conto O Livro de Areia, do escritor argentino Jorge Luiz Borges, em que uma obra na Biblioteca de Buenos Aires ganhava páginas incontáveis e novas a cada vez em que era manipulado, o trabalho de Soares de Camargo parece não ter fim, pela própria natureza de seu objeto de estudo.
Transações entre Partes Relacionadas, que trata de relações comerciais entre pessoas jurídicas de um mesmo grupo empresarial, nasceu como tese de doutorado na USP, em 2012. Publicado pela Almedina, teve as edições anteriores esgotadas. No começo de fevereiro, o autor conversou com o Insper Conhecimento.
IC – Como você classifica a importância do livro?
Soares de Camargo – Ele trata de um assunto da realidade. A primeira parte do livro é tirada dos meios de comunicação confiáveis, como Valor Econômico, O Estado de S. Paulo, Folha de S.Paulo e da extinta Gazeta Mercantil. Tornou-se referência na área jurídica.
Quais são as maiores dificuldades para a legislação? Há uma prática comum a ser seguida?
No Brasil, ainda não, mesmo que tenha avançado no assunto. Mas o problema é mundial. Imagine que você pega um empréstimo com seu primo. Ele é da família, vocês confiam um no outro, dispensam avalistas, não há burocracia. No mundo empresarial a situação é semelhante. Em princípio, há inúmeras vantagens no relacionamento de empresas do mesmo grupo. A questão é que existem problemas que vão do conflitos de interesse até a fraude pura e simples. O livro discute como se regular a prática.
O tema é novo e traz muitos desafios.
É uma das primeiras obras sobre o tema no mundo. Até então só havia papers sobre o assunto. Tento contribuir com a busca de soluções para algo que poucos sabem lidar. No Brasil, por exemplo, metade das regras cria incentivos para a prática das transações entre partes relacionadas e a outra metade tem punições contra ações não adequadas.
A saída está na regulação via leis ou na autorregulação?
Defendo uma solução mista. Há regras na lei brasileira para qualquer sociedade entre grupos empresariais, mas as empresas podem colocar, em seu documento que estabelece a sociedade, práticas que expliquem o contrato, com demonstrações financeiras transparentes. Informação hoje é diferencial competitivo, mas as companhias abertas tendem a ser mais confiáveis. O estado pode criar obrigações globais para as empresas, mas cada uma delas deve ter liberdade para seguir seu próprio modelo, com base nessas obrigações – desde que diga porque o escolheu e demonstrar que ele não é maléfico para o grupo empresarial.
Como a América Latina lida com a questão?
O Chile está muito avançado e tem bons modelos. Peru e Argentina vêm logo atrás. O mundo está se coçando pois a transparência das transações entre partes relacionadas torna o ambiente de negócios mais confiável. Há uma saudável concorrência mundial em melhorar a questão e o Brasil está ficando para trás.