Especialistas destacam metodologia e pioneirismo da pesquisadora
A pesquisa acadêmica econômica como se conhece hoje está diretamente relacionada à trajetória da historiadora brasileira Alice Canabrava, que foi a primeira professora catedrática da Universidade de São Paulo (USP). A importância de Canabrava e sua história foi debatida no Insper no evento Alice Canabrava: Um dos Grandes Nomes da História Econômica no Brasil.
O encontro teve a participação de Marcos Lisboa, presidente da escola, Delfim Netto, economista e ex-Deputado Estadual, Francisco Vidal Luna, economista, Samuel Pessôa, economista e colunista do jornal Folha de S.Paulo e William Summerhill, brasilianista e historiador econômico da Universidade da Califórnia (UCLA), em Los Angeles.
“O Brasil tem uma dívida com a história econômica do país e entender esse cenário, que passamos a ter a partir dos anos de 1930, é fundamental para sabermos a importância do trabalho desenvolvido até os dias de hoje”, destaca Marcos Lisboa, presidente do Insper.
O trabalho de doutorado de Canabrava, O Comércio Português no Rio da Prata, é referência ainda hoje em História Econômica e considerado pioneiro entre as pesquisas acadêmicas nesse segmento. “Alice chegou à tese com base na documentação que analisou e não por meio de uma hipótese, como é comum nesse tipo de estudo, marcando uma mudança de conceito na pesquisa acadêmica”, explica Francisco Luna. “A historiadora fez a integração das duas economias, Brasil e Buenos Aires, analisando o comércio do Rio da Prata sob um viés que nunca tinha sido avaliado, mostrando sua importância, apesar da questão política que dividia as duas regiões”, analisa Luna.
Com a repercussão do trabalho de doutorado da historiadora, surgiu a oportunidade de candidatar-se à vaga de titular da cadeira de História da América, em 1946, para a qual apresentou a tese A Indústria do Açúcar nas Ilhas Antilhas. Apesar de ter conseguido média mais alta no conjunto de provas para o cargo, foi preterida, e em seu lugar foi escolhido um professor contratado que já ministrava o curso na escola. Inconformada com o resultado, Canabrava deixa a Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da Universidade de São Paulo (USP).
No mesmo ano, era inaugurada a Faculdade de Ciências Econômicas e Administrativas (FCEA) e Canabrava passou a fazer parte do corpo de pesquisadores da escola dando continuidade ao seu trabalho, chegando a ocupar a diretora da FCEA, que originou a atual Faculdade de Economia Aplicada (FEA).
“As contribuições de Canabrava para a história econômica quantitativa são importantíssimas. Ela pegou números, dados, fatos e, utilizando econometria e estatística, embasou as conclusões dos seus trabalhos com soluções pioneiras para a história econômica quantitativa”, analisa Summerhill.
A pesquisadora teve também 33 trabalhos publicados em revistas acadêmicas e foi a primeira mulher a ocupar uma posição catedrática na USP, em um ambiente majoritariamente masculino na época. “Ela escreveu teses que ocupam espaços importantes em toda a prateleira de qualquer brasilianista que leva a história econômica do país a sério”, enfatiza Summerhill.
Como mestre, Canabrava deixou ensinamentos que são utilizados ainda hoje por seus alunos. “Para Alice, não existia indução ou dedução, existia o documento”, lembra Delfim Netto, que foi aluno de Canabrava na década de 1940. “Ela me ajudou com a concepção de que as coisas precisam de fatos”, destaca.
A precisão e rigor da pesquisadora na análise de dados também refletia em sua forma de lecionar. “Ela era uma professora que cobrava muito, fazia perguntas extremamente detalhistas, principalmente em provas orais. Aprendi muito com ela”, conclui Pessôa, que foi aluno de Canabrava na FEA.
Assista ao vídeo de transmissão do evento: