A pandemia de coronavírus tem dois efeitos negativos sobre as finanças públicas. De um lado, ajuda a acentuar o desequilíbrio entre receitas e despesas, que já vinha ocorrendo havia anos. Do outro, desafia governos a ampliarem a rede de proteção social para socorrer parcela crescente de brasileiros cuja renda sofrerá abalos duradouros.
Marcos Mendes, do Insper, elaborou proposta que concilia o objetivo de equacionar o endividamento estatal, para que a economia volte a crescer a taxas mais elevadas, com o de aumentar o escopo de políticas assistenciais aos mais pobres. Ela envolve conjugar uma série de medidas de curto prazo, a fim de evitar o estouro do limite de gastos federais, e assim prover tempo para que um ajuste estrutural seja executado nos próximos anos.
O exercício leva em conta as necessidades para financiar o Programa de Responsabilidade Social, proposto pelo Centro de Debates de Políticas Públicas. Ele pretende estender a rede assistencial a 18 milhões de famílias, com ações de garantia de renda mínima, seguro para lares vulneráveis e poupança para estudantes pobres.
A sua implementação completa exigiria do erário cerca de R$ 20 bilhões anuais adicionais, com pouco menos de R$ 15 bilhões já em 2021, num Orçamento federal que já vem sendo pressionado pelo aumento de despesas obrigatórias, como os benefícios previdenciários. O teto de gastos, dispositivo constitucional que impede o governo de gastar, em valores corrigidos pela inflação, além do que despendeu no exercício anterior, também vai ficando pressionado.
A fusão do Bolsa Família com os atuais Abono Salarial, para quem ganha até dois salários mínimos mensais no mercado formal, e o Seguro Defeso, para pescadores, formaria a base do custeio do novo programa. Como o Abono já tem compromissos de pagamento até 2022, em virtude de haver defasagem entre o fato gerador e o desembolso, seria preciso obter receitas transitórias até lá.
Isso poderia ser feito com o direcionamento para o custeio do programa social, até 2022, de emendas do Orçamento a que congressistas têm direito. Além disso, a fim de assegurar o cumprimento do teto enquanto o gasto social se expande, seriam necessárias medidas como congelar temporariamente a correção de aposentadorias acima de 3 salários mínimos, reduzir a remuneração e a jornada de trabalho de servidores e manter o veto presidencial à chamada desoneração da folha de pagamentos.
A partir de 2024, o objetivo de cumprir o teto de gastos exigirá um conjunto de reformas estruturais a ser deliberado desde já, pois seus efeitos demoram a aparecer. A reforma administrativa, a revisão da sobreposição entre o FGTS e o Seguro Desemprego, a melhora da defesa jurídica da União para reduzir custos com condenações e a mudança na política de subsídios agrícolas estão nessa lista.