O investimento dos governos, que, como proporção da economia, reduziu-se no Brasil ao longo da última década, poderia ter sua tendência revertida mediante reformas nas regras fiscais. Entre elas estão a adoção e a aplicação de limites mais rígidos de contenção das despesas com pessoal, no âmbito estadual, e a criação de instrumentos que facilitem o cumprimento de regras, como o teto de gastos, na esfera federal.
Para chegar a essa conclusão, os pesquisadores Marco Bonomo e Paulo Ribeiro, do Insper, e Cláudio Frischtak, da Inter.B Consultoria e do International Growth Center da LSE, simularam o efeito de mudanças de regras fiscais, algumas delas já propostas no Congresso Nacional, nos investimentos públicos e também em variáveis como resultado primário –o saldo de receitas e despesas não financeiras–, dívida e gastos governamentais.
A soma do que todas as esferas de governo desembolsaram em investimentos –como os em obras de infraestrutura e saneamento básico, incluindo os realizados por estatais– equivaleu a 4,6% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2010 e veio declinando ao longo da segunda década do século, chegando a 2,3% do PIB em 2019. Desta última cifra, o governo federal (0,4%) e as empresas por ele controladas (0,8%) responderam por cerca de metade. Os estaduais, juntos, investiram o correspondente a 0,4% do PIB.
No plano estadual, a análise destaca a relação entre o alto comprometimento das despesas com pessoal, de um lado, e a baixa capacidade de investir, do outro. Estados que aumentaram gastos com folha de pagamentos muito acima da mediana na década passada, como Rio de Janeiro e Minas Gerais, entraram em colapso no final do período e tiveram estrangulados os investimentos. Entes estaduais, como Espírito Santo e Ceará, cujas folhas de pagamento subiram abaixo da mediana, exibiram um nível maior de investimentos.
Para remediar a situação estadual, sobressaiu nas avaliações de Bonomo, Frischtak e Ribeiro a hipótese de reduzir o limite máximo de participação da folha de pagamento nas receitas e garantir o seu cumprimento. Hoje, a Lei de Responsabilidade Fiscal fixa em 60% esse teto, que é, na prática, desrespeitado por vários estados. As simulações dos pesquisadores indicam que um limite de 50%, desde que cumprido, seria capaz de elevar substancialmente os investimentos e ainda reduzir a dívida dos estados.
No âmbito federal, a dinâmica nas últimas décadas das despesas de execução obrigatória surge como principal fator de estrangulamento da capacidade de investir. Esses gastos federais determinados por normas constitucionais e infraconstitucionais, que representavam 14,9% do PIB em 2010, atingiram 17,6% do PIB em 2019. No período, os investimentos orçamentários recuaram de 0,8% do PIB para 0,3% do PIB.
Para frear a deterioração, em 2016 foi criado, por meio de emenda à Carta, o teto de gastos, que limita a alta do total de despesas não financeiras da União à inflação. Os autores estimam que, se a medida tivesse sido implantada em 2010, a União não teria registrado déficit primário até 2019 –o resultado tem sido negativo desde 2014–, e a dívida federal não teria ultrapassado 67% do PIB –equivaleu a 75,8%– no final do período.
A análise do trio de pesquisadores calcula o efeito de medidas legislativas que aumentem as ferramentas para a gestão fiscal e o cumprimento do teto. Nas simulações, sobressai o projeto de emenda à Constituição 438, que dispara mecanismos automáticos de repressão de despesas obrigatórias sempre que se aproximar o limiar em que a União precise passar a se endividar para manter a operação da máquina administrativa.
Com a PEC 48, o endividamento federal começaria a regredir já nos próximos anos –as simulações foram efetuadas antes da pandemia. Sem nenhuma medida adicional, a dívida não voltará a ser de dois dígitos durante esta terceira década do século, de acordo com a projeção.
Leia o estudo
“Public Investment and Fiscal Crisis in Brazil: Finding Culprits and Solutions”