Em meados de janeiro de 2017, o economista André Lara Resende, ex-diretor do Banco Central e um dos formuladores do Plano Real, publicou no jornal “Valor Econômico” o artigo Juros e Conservadorismo Intelectual. Nele, o especialista defende a visão do colega de classe norte-americano John H. Cochrane, que sugere que a teoria monetária usada há décadas está errada. De acordo com o economista, no modelo atual, quando o banco central eleva a taxa de juros, a inflação não cai, mas aumenta. Tal declaração causou muitas críticas.
“Quando publiquei esse artigo já estava escrevendo um livro. A proposta da obra era fazer uma análise desde 1944, a partir da controversa de planejamento entre Eugênio Gudin e Roberto Simonsen, até a criação do Plano Real, iniciado em 1994. Só que, durante a pesquisa, vi que a chamada nova ortodoxia, baseada em metas de inflação e na Regra de Taylor, tinha sérios problemas. E a opinião de Cochrane era igual a minha. Então, mudei o rumo da narrativa”, contou Lara Resende.
O tema ganhou as páginas do Valor Econômico nas semanas seguintes à publicação do artigo de Lara Resende. Contrários à sua tese, economistas ocuparam espaços no jornal para manifestar seus pontos de vista. Após a polêmica, o livro Juros, Moeda e Ortodoxia – Teorias monetárias e controversas políticas passou a ser dividido em duas partes: a primeira resgata o histórico econômico do Brasil com o debate entre Gudin e Simonsen, e a segunda traz para o cenário brasileiro algumas provocações feitas por Cochrane, como a teoria fiscal dos preços e a controversa sobre a política monetária.
O lançamento da obra ocorreu em 27 de junho no auditório Steffi e Max Perlman do Insper. À convite de André Lara Resende, os economistas contrários à tese do autor, Marcos Lisboa, presidente do Insper, Samuel Pessôa, pesquisador do Ibre/FGV e Pedro Garcia Duarte, professor da FEA-USP, expuseram suas ideias em um debate rico sobre a obra.
Debate sadio
A principal polêmica do livro de Lara Resende está baseada na visão sobre a taxa de juros. O economista defende que os juros nominais são sinalizadores importantes da inflação. E mais: no Brasil, os juros altos podem contribuir para o desequilíbrio fiscal. A conclusão vai contra a teoria dominante de que a taxa Selic mais alta é o principal instrumento de combate ao descontrole de preços.
Os participantes da mesa discordaram da afirmação feita pelo ex-diretor do Banco Central, pois os estudos usados como base indicam apenas o impacto do juro no curto prazo. “Não existe discussão sobre longo prazo. E, vale lembrar: neutralidade no longo prazo é um ponto pacífico”, afirmou Duarte.
A neutralidade também é apontada por Lisboa como uma implicação da teoria de Cochrane. “O efeito da moeda neutra não existe no longo prazo. Então, o debate sobre política monetária se torna irrelevante. Passa a ser apenas uma questão de ajustar o nível de preços. Assim, a discussão se torna empírica. O que explica melhor o comportamento da taxa de juros e da inflação no Brasil? Vamos testar e descobrir”, indagou o presidente do Insper.
Para Lara Resende, no entanto, não é possível fazer testes para descobrir os problemas econômicos do Brasil. Isso porque os modelos macroeconômicos não são testáveis. A solução apontada pelo economista é utilizar moldes da microeconomia para validar a macroeconomia.
Convergência
Apesar das divergências, Lisboa lembrou que existe um ponto em que todos concordam: o grande desafio da política econômica no Brasil é o fiscal. Pessôa vai além e aponta um estudo feito na América Latina. “Há uma pesquisa que estima o juro neutro em países latinos com base em seis modelos diferentes. Todos geram para o Brasil um juro sistematicamente maior do que para os outros. Sendo assim, o fenômeno econômico só pode ser um problema fiscal”, comentou.
Veja a gravação do evento:
Saiba mais sobre o evento Lançamento do livro: Juros, Moeda e Ortodoxia, de André Lara Resende