No debate sobre reforma tributária, o Ministério da Economia ventila a ideia de recriar um imposto sobre transações financeiras no Brasil. Do pouco que se sabe, ele em regra recolheria 0,4% de cada operação, teria potencial de arrecadar R$ 120 bilhões ao ano e substituiria uma parte do que a Receita Federal obtém com a contribuição sobre a folha salarial das empresas.
Defensores da ideia do governo argumentam que a introdução da taxa deveria ser cotejada com a contribuição que ela pretende em parte suceder, a que as empresas pagam ao INSS sobre a folha, que também provoca distorções econômicas. Não há notícia de estudos de boa qualidade que tenham feito essa comparação analítica.
Quanto à sua alíquota, a hipótese aventada somaria 0,4%, com a cobrança de 0,2% em cada ponta da operação –não se sabe se o imposto incidiria só sobre pagamentos em comércio eletrônico ou sobre qualquer movimentação financeira. Porém, em análise publicada há um ano, pesquisadores estimaram em 2,8% (1,4% no débito e 1,4% no crédito) o percentual médio necessário para assegurar o mesmo valor arrecadado com as contribuições dos empregadores.
Enquanto não se conhece a proposta, pode-se avaliar a experiência internacional e a brasileira com tributos desse gênero. No Brasil um deles vigorou de 1997 até a sua renovação ter sido recusada pelo Congresso, em 2007. Trata-se da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF), cuja alíquota variou de 0,2%, no início, a 0,38%, nos anos finais.
O saldo da revisão acadêmica não tem sido favorável à implantação duradoura desse tipo de taxação. Ele pode ser efetivo em situações de emergência, quando o governo precisa arrecadar depressa quantias expressivas, em razão de uma crise fiscal, por exemplo. Mas, com o tempo, começam a prevalecer as suas vulnerabilidades, listadas a seguir.
Cumulatividade
Quanto mais movimentações financeiras para produzir um bem ou serviço, mais eles serão tributados. Essa característica pune desproporcionalmente atividades que se valem mais de serviços financeiros sem motivo econômico para isso. Como sua incidência total é difícil de ser detectada e anulada, prejudica a competitividade das exportações, onerando-as.
Saiba mais em: Substituindo o PIS e o COFINS- e por que não a CPMF?- Por uma contribuição não-cumulativa.
Desintermediação
Para se livrar dos custos do imposto, os agentes tendem a recorrer menos às transações bancárias, por exemplo privilegiando internalizar etapas da produção e recorrendo ao dinheiro em espécie e a mecanismos informais de intercâmbio.
Saiba mais em: Bad Taxation: Disintermediation and Illiquidity in a Bank Account Debits Tax Model; Os Efeitos da CPMF sobre a Intermediação Financeira, Bank debit taxes: yield vs. disintermediation.
Distorção das escolhas de produtores e consumidores
Ao incentivar arranjos que não aconteceriam sem ele, como o escape da intermediação financeira, o tributo favorece padrões menos eficientes de produção e consumo. Negócios que ocorreriam deixam de ocorrer.
Saiba mais em: The bank debit tax in Colombia, Bank debit taxes in Latin America: an analysis of recent trends; Taxing Bank Transactions – The Experience in Latin America and Elsewhere.
Encarecimento do crédito
O tributo sobre transações incide diretamente sobre os empréstimos, tornando-os mais caros. Empresas que dependem de mais crédito tendem a ser prejudicadas. Por esse mesmo mecanismo os juros pagos pelo governo em seus empréstimos estariam mais propensos a aumentar, o que anula uma parte da arrecadação do imposto.
Saiba mais em: Os Impactos Econômicos da CPMF: Teoria e Evidência; The effects of taxing bank transactions on bank credit and industrial growth: Evidence from Latin America.
Corrosão da base de arrecadação
Como incentiva a fuga da intermediação financeira, o imposto ao longo do tempo reduz o conjunto do qual extrai a receita. O governo tende a reagir a esse efeito majorando alíquotas, o que por sua vez aumenta o incentivo à desintermediação.
Saiba mais em: The Rates and Revenue of Bank Transaction Taxes.
Incidência desigual
Além do efeito direto sobre as transações, existe repercussão no consumo das famílias, uma vez que o impacto do tributo é transferido a preços de produtos e serviços. Proporcionalmente, há maior incidência na renda dos mais pobres, como ocorre com as taxações indiretas em geral.
Saiba mais em: A regressividade da CPMF.